A APM-RedeMut – Associação Portuguesa de Mutualidades vem, no âmbito da consulta pública às alterações ao Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), prestar a sua visão e contributos, esperando que os mesmos sejam incorporados no documento final que em breve será apresentado à União Europeia.

A APM-RedeMut analisou com profundo interesse as alterações ao PRR submetidas a consulta pública, e tendo em consideração que:

  • O Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) é um programa de âmbito nacional, com um período de execução até 2026, que pretende implementar um conjunto de reformas e de investimentos destinados a impulsionar o país no caminho da retoma, do crescimento económico sustentado e da convergência com a Europa ao longo da próxima década, tendo como orientação um conceito de sustentabilidade inspirado nos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) das Nações Unidas. 
  • O PRR está alinhado com os seis pilares relevantes da estratégia europeia 2030:
  • Transição verde;
  • Transformação digital;
  • Crescimento inteligente, sustentável e inclusivo, incluindo coesão económica, emprego, produtividade, competitividade, investigação, desenvolvimento e inovação, e um Mercado Único em bom funcionamento com pequenas e médias empresas (PME) fortes;
  • Coesão social e territorial;
  • Saúde e resiliência económica, social e institucional, inclusive com vista ao aumento da capacidade de reação e preparação para crises;
  • Políticas para a próxima geração, crianças e jovens, incluindo educação e competências.

Como primeira consideração, cumpre-nos dizer o seguinte:

Se no contexto global, que serve de enquadramento às alterações ora propostas (guerra na europa; crise energética; carência de matérias-primas e inflação), a APM-RedeMut compreende algumas das políticas que canalizam investimentos para reformas que o justificam, como é o caso transformação da administração pública e da ciência mais digital, não pode deixar de reiterar o que afirmou em sede de primeira consulta pública ao PRR.

Constitui uma falta de visão estratégica do Governo Português não envolver, de forma transversal, o setor da Economia Social no processo de recuperação económica para a década, e não olhar para o setor como um todo, nas suas múltiplas atividades, que contêm um grande potencial estratégico de desenvolvimento económico e social do país, como é, aliás, reconhecido pelo Plano de Ação Europeu para Economia Social e pela respetiva Resolução do Parlamento Europeu, de 6 de julho 2022.

Partindo dessa diversidade de respostas que o setor dá, o Governo devia incluir no PRR uma componente de investimento específica para a Economia Social, que impulsione a respetiva transformação digital (que pode passar por alterações organizacionais de desmaterialização de processos, mas também de inovação e requalificação tecnológica das atividades económicas desenvolvidas, como a saúde); a sustentabilidade e transformação energética; a vitalidade e qualidade das respostas que dá (a requalificação do edificado, sobretudo na área da saúde) e a qualificação dos agentes que operam no setor.

Assim, não se aceita que o sector da Economia Social, em termos conceptuais e estratégicos, tenha sido, uma vez mais, ignorado.

Feito este primeiro enquadramento, a APM-RedeMut dá a seguinte nota da análise que efetuou aos três eixos de investimentos do PRR: Resiliência; Transição climática e Transição digital, que contêm as tipologias de reformas e as linhas de investimento, e às alterações ora propostas:

Primeiramente, uma nota positiva para as medidas da simplificação dos quadros jurídicos e regulamentares aplicáveis aos projetos de energias renováveis e da eficiência e simplificação dos benefícios fiscais.

Depois, no que respeita às propostas de alteração para a reforma da saúde, lamentamos que a nova medida – Programa de Modernização Tecnológica do SNS, mantenha a lógica de reformar apenas o setor público da saúde, tendo por destinatários apenas os hospitais públicos.

Como já tivemos oportunidade de afirmar em sede de consulta pública inicial ao PRR, estranhamos, uma vez mais, que o eixo resiliência, na sua componente de reforma da saúde, não seja canalizado, também, para as reformas na saúde que são necessárias fazer pelo setor da economia social.

Do mesmo modo que os equipamentos públicos carecem de reestruturação e que é preciso garantir a modernização tecnológica no SNS, também os equipamentos detidos por entidades da economia social precisam, nalguns casos, de requalificação do edificado e de modernização dos equipamentos moveis de diagnóstico e inovação tecnológica, devendo essas necessidades figurarem, também, no elenco das reformas e dos investimentos que concretizam o plano de reestruturação e resiliência, considerando o apoio complementar que dão ao setor publico e ao atendimento de milhares de pessoas.

Acresce ainda que, a resiliência do sistema de saúde de um país vai para além do reforço do sistema público de saúde. É preciso relembra que o sistema de saúde português engloba o sistema social de saúde, e que as mutualidades e outras entidades da Economia Social asseguram o acesso a cuidados de saúde a milhares de portugueses, que de outro modo não teriam, ou teriam com maior dificuldade, garantidos tais cuidados, em especial de medicina geral e familiar e saúde oral.

É sempre importante relembrar que segundo dados do observatório mutualista da APM, em 2018, as 23 associadas da APM-RedeMut realizaram mais de 600.000 atos de saúde, a que corresponderam cerca de 200.000 consultas e 400.000 exames complementares de diagnostico e terapêutica.

Ainda na área da reforma da saúde, e considerando os resultados que se pretendem alcançar no âmbito deste pilar, designadamente a instalação de consultórios dentários em todos os centros de saúde e a construção de novas unidades de saúde, APM-RedeMut defende ser de extrema relevância priorizar a colaboração com o setor social que tem capacidade instalada que não se encontra esgotada e pode estabelecer parcerias para os cuidados de saúde oral e outros cuidados de saúde primários e hospitalares. Os recursos são escassos, pelo que, antes de instalar e construir novos, devem ser otimizadas as respostas que já estão operacionais e a funcionar com qualidade e eficiência.

Por outro lado, a atividade económica da saúde constitui, atualmente, um enorme desafio em matéria de inovação e transformação tecnológica que carece de enorme investimento.  Com efeito, há projetos nas áreas da teleconsulta e dos telecuidados que trazendo inovação tecnológica para os cuidados de saúde, carecem de investimento para serem alavancados.

Vislumbra-se, também, num horizonte de curto prazo, a necessidade de introduzir alterações nos sistemas de informação da saúde, no sentido de dar cumprimento à partilha de dados que o Regulamento europeu dos dados de saúde vai impor aos Estados membros que terão de garantir a interoperabilidade dos sistemas, a dois níveis, nacional e europeu, o que implicará avultado investimento.

Do que fica exposto, e no que à reforma da saúde diz respeito, deve ser revista a nova medida de modernização tecnológica do SNS no sentido de acomodar nesta medida a transformação tecnologia que também é necessária fazer no setor da saúde da economia social que é responsável pelo acesso a cuidados de saúde de muitos milhares de portugueses.

Mas é preciso ir mais longe, e alterar no eixo da resiliência a componente 01 do PRR – SNS, alterando esta nomenclatura para resiliência do sistema de saúde, para acomodar a necessária transformação e requalificação da área da saúde do setor social, clarificando, assim, que um conjunto de reformas e investimentos que nela se integram, como a RE. C1. i06: Transição digital na saúde, também se aplicam ao setor da economia social.

No que respeita à nova medida Indústria 4.0, a incluir na Componente 16 do PRR, Empresas 4.0, que se assume comoum apoio complementar à medida “Apoio a Modelos de Negócio para a Transição Digital” já em curso, poder-se-á pensar que as atividades do setor da economia social e a sua transformação digital teriam aqui cabimento considerando a referência expressa a que a medida se destina a PME de todos os setores de atividade que se posicionam nas cadeias de valor do processo.

Ora, continuamos a ter as mesmas dúvidas que partilhamos na consulta pública inicial. Além da dificuldade do registo das entidades no IAPMEI, organismo especialmente vocacionado para apoiar o tecido empresarial, trata-se de realidades estruturalmente diferentes que deviam ser tratadas de forma diferente.

Continuamos a questionar-nos se não seria mais profícuo uma linha especifica para a inovação dos modelos de negócio do setor social, não para dar resposta à competitividade das empresas, mas para assegurar o acesso a direitos fundamentais das pessoas e assim contribuir para assegurar as metas do plano de ação europeu dos direitos sociais.

O mesmo se diga em relação à medida da transição digital das empresas preconizada para a Região Autónoma dos Açores

No que respeita à nova geração de equipamentos e respostas sociais, que será reforçada com 100M de euros, importa clarificar se os serviços de apoio domiciliário englobam a componente da saúde. Com efeito, o SAD saúde é uma resposta tipificada no âmbito dos cuidados continuados e não das respostas sociais, mas é seguramente a área onde as instituições da economia social, em particular as mutualidades que representamos, estão mais disponíveis para realizar investimento.

Por último, de saudar o reforço de 80M de euros na eficiência energética dos edifícios de serviços, que continua a manifestar-se como sendo uma necessidade urgente destas organizações.

De saudar ainda o projeto piloto a implementar na RAA “ageing in place” que, do mesmo modo, deveria ser implementado igualmente no continente.

O Conselho de Administração

APM