O objetivo do Dia Mundial da Justiça Social (comemora-se todos os anos a 20 de fevereiro) é enfrentar as realidades da pobreza, do desemprego e da exclusão, tentando criar oportunidades para todos e combatendo as desigualdades no mundo. Nesta data a ONU faz um apelo às nações para a eliminação de barreiras sociais. Pode uma Instituição Financeira, um qualquer Banco, assumir esse propósito e em que níveis?
Para o combate à pobreza, há́ dois grandes tipos de respostas:
- «Mais do mesmo», ou seja, políticas e medidas para ajudar os pobres (aumentos do ordenado mínimo, subsídios, etc.), que não acabam com a pobreza, apenas melhoram um pouco, e a curto prazo, a vida dos pobres.
- Ou o dar oportunidades para que os pobres possam acabar com a pobreza, não os condenando, com pequenas ajudas, a continuarem pobres, mas incentivando-os a deixar, por si próprios, a situação de pobreza em que vivem.
Fruto da crise financeira vivida na última década, os Bancos têm sido vistos como causadores e agravadores de problemas sociais. Porque não passar a vê-los como um instrumento para a resolução de alguns problemas sociais, nomeadamente os que concernem a dificuldades financeiras das famílias e empresas?
Acima de tudo, podem surgir novos negócios para a Banca, com retorno financeiro e crescimento de clientes, se esta souber construir os seus produtos financeiros a partir de novos objetivos de atividades e pela busca de soluções na concretização de pedidos de apoio financeiro pelos seus clientes.
Tradicionalmente, os tipos de problemas específicos que são abordados por respostas organizadas de uma sociedade são o desemprego, a doença, a solidão, o tratamento de resíduos de diferentes espécies, a poluição, a velhice, as drogas e outros crimes, as carências de grupos com necessidades especiais e mesmo a pobreza material. Mas, como ponto prévio, e para lhe ser possível dar uma resposta no domínio das políticas sociais, é necessário também integrar as limitações e condicionantes financeiras na classe de novos problemas sociais, nomeadamente o sobre-endividamento, que ainda não foi olhado como um dos mais graves problemas sociais existentes.
Há muitas pessoas que caíram na armadilha do sobre-endividamento, pelo recurso a cartões de crédito e outros empréstimos de curto prazo obtidos, mas cujas exigências para o reembolso e encargos se encontram, num dado momento, acima dos seus rendimentos disponíveis.
Não significa que sejam incumpridores, para já, mas cumprem com um esforço financeiro que condiciona outros patamares essenciais da sua vida., nomeadamente a educação e saúde.
As famílias e as empresas sobre endividadas centram-se em si próprias, perdem-se em tentativas de resolução dos seus problemas de sustentabilidade e de solvabilidade, desenvolvem rotinas de pensamento viciadas e obsessivas, presas em labirintos económicos, financeiros e mentais que não as deixam contribuir positivamente para a sociedade em que se inserem.
Uma Instituição financeira que se dedique a operações de reestruturação sustentáveis destas operações, que em Portugal atingem já mais de 650 mil famílias, tem uma possibilidade de captar novos clientes, sem precisar de dispendiosas campanhas de marketing de resultados duvidosos, e prestando adicionalmente um serviço à sociedade.
Ajudar os mais frágeis, pelo desafio que acarreta em termos de busca de soluções sustentáveis, é um dos focos de que as empresas mais necessitam para os seus desafios de inovação e mudança. Por exemplo, a criação do microcrédito, que está na base da consolidação de um Banco inovador, o Grameen Bank no Bangladesh, foi uma resposta à perceção das dificuldades financeiras de mulheres trabalhadoras em artesanato com os seus credores de matérias-primas, que acabavam por explorar o seu trabalho e por conduzi-las a uma vida de escravidão. A procura de uma solução para esse sofrimento, por parte de Muhammad Yunus, deu origem a uma primeira grande revolução na atividade financeira contemporânea.
A inovação da atividade bancária tem assentado, sobretudo, na introdução de tecnologia na comunicação com os seus clientes, sendo quase inexistente ao nível da criação de novos produtos financeiros. Mas a identificação de problemas, com o intuito de os resolver, tem sido, na História, o grande motor para a construções de soluções mais avançadas e inovadoras.
Pode este curriculum de vida de 115 anos da Caixa Económica do Porto trazer-nos algo de novo e diferenciador ao nível da atividade bancária atual? Uma pequena história:
“Cruzei-me há cerca de quinze dias com um amigo que tinha vendido um relógio de ouro por 5 mil euros, para pagar despesas diversas com estudos dos filhos, no estrangeiro.
A atual situação de instabilidade que vivemos levou a que dividendos de ações que possui em carteira não tivessem ainda sido distribuídos. Ponderou recorrer a um crédito ao consumo, mas desistiu por demorar 3 semanas a ter o dinheiro em conta. Por ter aversão ao risco e endividamento por esta via, nunca usou cartões de crédito, pelo que não tinha essa opção.
Com muito pesar por ser um objeto de coleção, teve de recorrer a esta opção. Ainda mais lhe custava, porque sabia que esse pagamento de dividendos seria feito em Setembro e que os 5 mil euros valeriam uns 50% do real valor de mercado do relógio.
Falei-lhe neste produto da Caixa Económica do Porto, entidade que é supervisionada pelo Banco de Portugal, e expliquei-lhe que podia ter despendido 250 euros a resolver o seu problema”.
A visão sobre empréstimos sobre penhores é ainda hoje algo distorcida, associando-os sempre e só a pessoas em carência plena de recursos e em necessidades financeiras extremas, o que é restritivo do seu alcance. Não obstante, este tipo de empréstimos surgiu precisamente, tal como o microcrédito de Yunus, de uma defesa do direito ao crédito de pessoas de baixos rendimentos, por haver quem não lhe tenha fácil acesso, desde logo, por não ter conta bancária. Por exemplo, uma conta de eletricidade para além do esperado, uma doença, um computador para o estudo …
Há todo um conjunto de situações nas vidas de todos nós que podem encontrar resposta, e fazê-lo numa lógica de partilha de ganhos e de resolução de problemas das pessoas é a forma mais nobre de se desenvolver uma atividade económica.
Uma entidade financeira integrante da economia social tem um papel importante na sociedade por este papel de intermediação de fundos, tendo-o de o fazer de uma forma responsável e sustentável, procurando estruturar produtos que tenham objetivos para além dos meramente materiais: na oferta de empréstimos de forma rápida e sem burocracia ou exigência de garantias pessoais, como os créditos com penhor, na remuneração de aplicações a prazo, e, em breve, com o microcrédito, com as operações com garantia mútua que substituem garantias reais, pelos créditos para obras de reabilitação de pensionistas de baixos rendimentos ou a moradores em bairros sociais.
José Ferraz Alves, Direção Caixa Económica do Porto